[CRÍTICA] ERA UMA VEZ EM… HOLLYWOOD

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ERA UMA VEZ EM… HOLLYWOOD

1. ERA UMA VEZ EM… HOLLYWOOD

1969 foi um ano deveras agitado para os Estados Unidos. Enquanto Richard Nixon assumia a presidência dos Estados Unidos, o homem pousava na Lua e a tensão entre a América e a União Soviética crescia cada vez mais. Além disso, foi o fatídico ano em que três membros da Família Manson, um culto incitado por Charles Manson, invadiram a casa do diretor Roman Polanski, assassinando sua esposa, Sharon Tate.

Por conta disso, Hollywood virou de ponta cabeça, já que era a primeira vez que um atentado tão hediondo desestruturava a fundação da indústria cinematográfica. A partir daí, o império das salas de cinema começou a entrar em uma espécie de “declínio”, dando fim à sua famosa Era de Ouro. Porém, em seu mais novo filme, Quentin Tarantino quis contar uma história diferente.

Era Uma Vez em… Hollywood segue a história de dois personagens que nunca existiram na vida real. Aqui, acompanhamos Rick Dalton (Leonardo DiCaprio), um astro de ação em decadência, que vai para todos os lados com seu fiel amigo e dublê Cliff Booth (Brad Pitt), cujo passado sinistro o atormenta dentro e fora da indústria cinematográfica
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Rick é vizinho de duas pessoas muito famosas: o cineasta franco-polonês Roman Polanski (Rafał Zawierucha), que havia tido uma ascensão meteórica nos Estados Unidos com o lançamento de O Bebê de Rosemary, bem como sua esposa, Sharon Tate (Margot Robbie). A partir daí, acompanhamos fragmentos da vida de Dalton, Booth e Tate ao longo do fatídico ano de 1969.

E quando falamos o nome Quentin Tarantino, já elevamos nossas expectativas. Considerado um dos grandes cineastas da atualidade, o diretor presenteou o mundo com diversas obras memoráveis, como Pulp Fiction: Tempo de Violência, Kill Bill e Django Livre. Qualquer coisa que o diretor toca é alvo de curiosidade e altas expectativas, e aqui não podia ser diferente. E mais uma vez, Tarantino não decepciona.

O filme é uma carta de amor à história de Hollywood, por mais que vários eventos aconteçam de forma diferente da realidade e diversos personagens sejam criações originais para o longa. O interessante aqui é acompanhar essas figuras em um retrato ao mesmo tempo realista e exagerado da cidade de Los Angeles, conforme todos lutam por objetivos similares: fama, sucesso e reconhecimento.
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Aliás, as obras de Tarantino sempre são conhecidas por seguir um modelo muito particular. O diretor sempre preferiu explorar seus personagens, bem como as inter-relações entre eles em vez de elementos mais tradicionais, como linearidade temporal ou até mesmo construção de enredo. Em outras palavras, os filmes do cineasta são construídos em cima de seus personagens, de suas vidas e dinâmicas.

E aqui não é diferente – na realidade, dá até para dizer que é o longa que mais se apropria dessa técnica narrativa. E as congratulações não devem ser dirigidas apenas a Tarantino, como também aos seus atores. Leonardo DiCaprio nos traz uma interpretação crua e divertida. A vida de seu personagem é um drama, mas o astro consegue beirar os limites entre a tragédia e a comédia de forma perfeita.

Já Brad Pitt é menos espalhafatoso, mas constrói uma figura memorável e única. A relação de Booth e Dalton é o que impulsiona a trama de uma maneira muito fluida. De certa forma, dá até para pensar que esses dois personagens existiram na vida real, e não são criações de uma obra de ficção. Já Margot Robbie brilha, apesar do pouco tempo de tela. De muitas maneiras, ela é o coração do filme, e o longa não deixa de ser uma carta de amor a Sharon Tate.
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E é justamente essa relação que torna o filme tão único e especial. Nas mãos de outro diretor, um que não soubesse lidar com personagens, o filme seria apenas uma bagunça mesclando eventos desconjuntados. Nas mãos de Tarantino, o longa não deixa de ser uma bagunça – mas, por sua vez, é uma bagunça controlada. O diretor insere vários elementos que não conversam entre si, mas com um domínio tão amadurecido que tudo flui naturalmente.

Isso porque o longa não está preso à ideia de uma narrativa padrão. Seu objetivo é muito mais simples: recriar a vida em Hollywood no fim dos anos 60, a partir da ótica de personagens fictícios e abstrações ficcionais de pessoas reais, o que consegue com um êxito tremendo. E é muito reconfortante ver um diretor tão hábil inserindo originalidade bruta em um mercado dominado pelo blockbuster e pelas explosões.

Isso, no entanto, não torna o filme menos acessível ao público ou sequer menos divertido. Por mais que seja um longa lento e mais “artístico”, por falta de uma palavra melhor. Além disso, outros elementos de Tarantino entram em cena mais uma vez, como os diálogos muito elaborados – destaque para a conversa entre Dalton e uma atriz mirim – e a violência hiperbólica – que, aliás, poderia ser um pouco mais longa.

O resultado final é um delírio, no melhor sentido possível da palavra.
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Aliás, a parte técnica é outro destaque que precisa ser aplaudido de pé aqui. Após filmes como Os Oito Odiados e o já citado Django Livre, que também possuíam méritos notáveis nesse quesito, Tarantino apresenta outra obra de arte não apenas no campo narrativo, mas também estético. O destaque, obviamente, é a fotografia envelhecida, que lembra bastante os filmes da década de 60 sem perder algumas inovações tecnológicas atuais.

A câmera é fluida e desliza como um fantasma, até mesmo nas cenas mais longas e “paradas”. No entanto, os melhores momentos se dão nas sequências que exigem movimentos mais rápidos, como as cenas em que os personagens estão dirigindo alopradamente pelas ruas de LA. Ali, vemos uma direção mais ágil, que não perde as características do filme como um todo.

Já o trabalho sonoro é outro elemento que merece ser elogiado. Apesar do som cristalino e cheio de elementos que só podem ser apreciados em uma sala de cinema, há também um glamour sessentista na construção do áudio, que conta com alguns efeitos sonoros típicos dos filmes e, sobretudo, programas televisivos da época. Isso se destaca principalmente nas cenas onde o sangue rola solto.
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Entretanto, o verdadeiro herói desse filme reside no departamento de arte. A direção de arte é precisa e cheia de excessos, casando o cinema propriamente Tarantinesco ao período de excessos de Hollywood. E isso é altamente complementado pelo figurino, que consegue dar personalidade aos personagens sem que eles ao menos abram suas bocas. A indicação desses departamentos ao Oscar é, no mínimo, certeira.

Aliás, a reconstrução de época também é notável. As ruas, letreiros, cinemas, estúdios de filmagens, mansões e até mesmo ambientes mais fechados, como restaurantes e aviões conseguem trazer uma imersão completa. Há cenas em que vemos filmes e séries de TV protagonizados por Rick Dalton, e é nítido como o personagem realmente parece ter sido um galã de ação daquele período.

Por falar nisso, imersão é a palavra que dita esta obra. Várias cenas nos fazem ficar vidrados no que está acontecendo nas telas – e um exemplo bem peculiar disso se dá na gravação de um piloto de TV por Dalton. Ficamos tão inseridos na dinâmica dos atores que, de repente, somos levados a outra história sem perceber. A imersão só quebra (propositalmente) quando Dalton esquece de uma fala e a cena é abruptamente interrompida.
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Além disso, o filme até é mais “restrito” do que outros que falam sobre cinema, mas não deixa de nos trazer vários elementos da indústria. Diversas figuras históricas são apresentadas aqui, compondo um senso ainda maior de realidade. Entre alguns nomes, podemos citar Steve McQueen, Jay Sebring, Connie Stevens, Charles Manson e até mesmo Bruce Lee – o que recentemente rendeu polêmicas para Tarantino.

Tudo isso faz com que Era Uma Vez em… Hollywood seja o produto afetivo de alguém que não apenas ama ver e fazer filmes, mas que entende a indústria cinematográfica como um todo e que, no mínimo, acha interessante fazer parte dela. É uma obra completa e que talvez não agrade o espectador comum, mas que certamente vai atingir o coração dos fãs de Tarantino.

Em outras palavras, Era Uma Vez em… Hollywood é a prova de que o diretor está cada vez mais consciente de seu papel e, ainda assim, não perde sua identidade na hora de conceber filmes únicos, com diálogos cheios de excessos e violência extrema. Tem tudo para se tornar mais um grande clássico da carreira do diretor, com suas duas horas e quarenta minutos de duração, que são sentidas e, ao mesmo tempo, necessárias.

Não deixa de ser um filme que tece um olhar crítico sobre a indústria, mas também o faz com uma abordagem afetiva óbvia. E, surpreendentemente – para os padrões do diretor – consegue não apenas ser um filme engajante, como também fofo, sincero e emocionante, deixando um gostinho agridoce de como a história poderia ter sido se ela, ao menos uma vez, imitasse a ficção.
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8. nota do filme

NOTA: 5/5
8. nota do filme
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