1
Carnavália Repique tocou O surdo escutou E o meu corasamborim Cuíca gemeu, será que era meu, quando ela passou por mim? [...] ANTUNES, A.; BROWN, C.; MONTE, M. Tribalistas, 2002 (fragmento). No terceiro verso, o vocábulo “corasamborim”, que é a junção coração + samba + tamborim, refere-se, ao mesmo tempo, a elementos que compõem uma escola de samba e à situação emocional em que se encontra o autor da mensagem, com o coração no ritmo da percussão. Essa palavra corresponde a um(a)
termo técnico, dado que designa elemento de área específica de atividade.
gíria, que compõe uma linguagem originada em determinado grupo social e que pode vir a se disseminar em uma comunidade mais ampla.
estrangeirismo, uso de elementos linguísticos originados em outras línguas e representativos de outras culturas.
neologismo, criação de novos itens linguísticos, pelos mecanismos que o sistema da língua disponibiliza.
regionalismo, por ser palavra característica de determinada área geográfica.
2
"O mundo é grande O mundo é grande e cabe Nesta janela sobre o mar. O mar é grande e cabe Na cama e no colchão de amar. O amor é grande e cabe No breve espaço de beijar. ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1983. Neste poema, o poeta realizou uma opção estilística: a reiteração de determinadas construções e expressões linguísticas, como o uso da mesma conjunção para estabelecer a relação entre as frases. Essa conjunção estabelece, entre as ideias relacionadas, um sentido de"
comparação.
finalidade.
alternância.
oposição.
conclusão.
3
"Poema de sete faces Quando eu nasci, um anjo torto desses que vivem na sombra disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida. As casas espiam os homens que correm atrás de mulheres. A tarde talvez fosse azul, não houvesse tantos desejos. [...] Meu Deus, por que me abandonaste se sabias que eu não era Deus se sabias que eu era fraco. Mundo mundo vasto mundo, se eu me chamasse Raimundo seria uma rima, não seria uma solução. Mundo mundo vasto mundo mais vasto é o meu coração. Carlos Drummond de Andrade. Obra completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 1964. p. 53. No verso “Meu Deus, por que me abandonaste”, Drummond retoma as palavras de Cristo, na cruz, pouco antes de morrer. Esse recurso de repetir palavras de outrem equivale a"
"emprego estilístico da fala de outra pessoa."
"uso de uma pergunta sem resposta"
"repetição desnecessária de ideias."
"uso de vício de linguagem pouco tolerado."
"emprego de termos moralizantes."
4
té quando? Não adianta olhar pro céu Com muita fé e pouca luta Levanta aí que você tem muito protesto pra fazer E muita greve, você pode, você deve, pode crer Não adianta olhar pro chão Virar a cara pra não ver Se liga aí que te botaram numa cruz e só porque Jesus Sofreu não quer dizer que você tenha que sofrer! GABRIEL, O PENSADOR. Seja você mesmo (mas não seja sempre o mesmo). Rio de Janeiro: Sony Music, 2001 (fragmento). As escolhas linguísticas feitas pelo autor conferem ao texto:
caráter atual, pelo uso de linguagem própria da internet
cunho apelativo, pela predominância de imagens metafóricas.
tom de diálogo, pela recorrência de gírias.
originalidade, pela concisão da linguagem.
espontaneidade, pelo uso da linguagem coloquial.
5
Cabeludinho Quando a Vó me recebeu nas férias, ela me apresentou aos amigos: Este é meu neto. Ele foi estudar no Rio e voltou de ateu. Ela disse que eu voltei de ateu. Aquela preposição deslocada me fantasiava de ateu. Como quem dissesse no Carnaval: aquele menino está fantasiado de palhaço. Minha avó entendia de regências verbais. Ela falava de sério. Mas todo-mundo riu. Porque aquela preposição deslocada podia fazer de uma informação um chiste. E fez. E mais: eu acho que buscar a beleza nas palavras é uma solenidade de amor. E pode ser instrumento de rir. De outra feita, no meio da pelada um menino gritou: Disilimina esse, Cabeludinho. Eu não disiliminei ninguém. Mas aquele verbo novo trouxe um perfume de poesia à nossa quadra. Aprendi nessas férias a brincar de palavras mais do que trabalhar com elas. Comecei a não gostar de palavra engavetada. Aquela que não pode mudar de lugar. Aprendi a gostar mais das palavras pelo que elas entoam do que pelo que elas informam. Por depois ouvi um vaqueiro a cantar com saudade: Ai morena, não me escreve / que eu não sei a ler. Aquele a preposto ao verbo ler, ao meu ouvir, ampliava a solidão do vaqueiro. BARROS, M. Memórias inventadas: a infância. São Paulo: Planeta, 2003. No texto, o autor desenvolve uma reflexão sobre diferentes possibilidades de uso da língua e sobre os sentidos que esses usos podem produzir, a exemplo das expressões “voltou de ateu”, “disilimina esse” e “eu não sei a ler”. Com essa reflexão, o autor destaca
os desvios linguísticos cometidos pelos personagens do texto.
a valorização da dimensão lúdica e poética presente nos usos coloquiais da linguagem.
o relato fiel de episódios vividos por Cabeludinho durante as suas férias.
a distinção clara entre a norma culta e as outras variedades linguísticas.
a importância de certos fenômenos gramaticais para o conhecimento da língua portuguesa.