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Leia os textos e responda às questões 01, 02 e 03. Texto II A BAGACEIRA Era o êxodo1 da seca de 1898. Uma ressurreição de cemitérios antigos – esqueletos redivivos2, com o aspecto terroso e o fedor das covas podres. Os fantasmas estropiados3 como que iam dançando, de tão trôpegos e trêmulos, num passo arrastado de quem leva as pernas, em vez de ser levado por elas. Andavam devagar, olhando para trás, como quem quer voltar. Não tinham pressa em chegar, porque não sabiam aonde iam. Expulsos de seu paraíso por espadas de fogo, iam, ao acaso, em descaminhos, no arrastão dos maus fados4. Fugiam do sol e o sol guiava-os nesse forçado nomadismo5. Adelgaçados6 na magreira cômica, cresciam, como se o vento os levantasse. E os braços afinados desciam-lhes aos joelhos, de mãos abanando. Vinham escoteiros7. Menos os hidrópicos8 – doentes da alimentação tóxica – com os fardos das barrigas alarmantes. Não tinha sexo, nem idade, nem condição nenhuma. Eram os retirantes. Nada mais. Meninotas, com as pregas da súbita velhice, careteavam, torcendo as carinhas decrépitas9 de ex-voto10. Os vaqueiros másculos, como titãs alquebrados, em petição de miséria. Pequenos fazendeiros, no arremesso igualitário, baralhavam-se nesse anônimo aniquilamento. Mais mortos do que vivos. Vivos, vivíssimos só no olhar. Pupilas do sol da seca. Uns olhos espasmódicos de pânico, como se estivessem assombrados de si próprios. Agônica11 concentração de vitalidade faiscante. Fariscavam12 o cheiro enjoativo do melado que lhes exacerbava os estômagos jejunos. E, em vez de comerem, eram comidos pela própria fome numa autofagia13 erosiva. [...] A cabroeira14 escarninha15 metia-os à bulha16: – Vem tirar a barriga da miséria. Párias da bagaceira17, vítimas de uma emperrada organização do trabalho e de uma dependência que os desumanizava, eram os mais insensíveis ao martírio das retiradas. A colisão dos meios pronunciava-se no contato das migrações periódicas. Os sertanejos eram mal vistos nos brejos. E o nome de brejeiro cruelmente pejorativo. [...] Essa diversidade criava grupos sociais que acarretavam os conflitos de sentimentos. Estrugia18 a trova repulsiva: Eu não vou na sua casa, Você não venha na minha, Porque tem a boca grande, Vem comer minha farinha... Homens do sertão, obcecados na mentalidade das reações cruentas, não convocavam as derradeiras energias num arranque selvagem. A história das secas era uma história de passividades. Limitavam-se a fitar os olhos terríveis nos seus ofensores. [...] Dagoberto olhava por olhar, indiferente a essa tragédia viva. A seca representava a valorização da safra. Os senhores de engenho, de uma avidez vã, refaziam-se da depreciação dos tempos normais à custa da desgraça periódica. [...] Questão 01 Com relação à temática apresentada, os Textos I e II
fazem uma representação realista da vida ao abordar um grave problema social, traduzindo os males e as angústias dos retirantes nordestinos.
fazem referência ao mesmo tema, ambos descrevem a trajetória dos retirantes por meio da perspectiva dos senhores de engenho.
contradizem o tema, pois o quadro é composto por tons terrosos e de cinza, enquanto o trecho do romance enfatiza a avidez dos senhores de engenho.
diferem quanto ao tema: no quadro, temos representadas as mazelas e o sofrimento; no trecho do romance, percebemos a exaltação dos retirantes.
abordam temas relativos ao sentimento nordestino: no quadro, percebe-se o sofrimento; no trecho do romance, o humor.
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Questão 02 A pintura de Portinari pode ser associada ao romance “A Bagaceira” pelo seguinte trecho
“Os fantasmas estropiados como que iam dançando, de tão trôpegos e trêmulos, num passo arrastado de quem leva as pernas, em vez de ser levado por elas [...]”
“Homens do sertão, obcecados na mentalidade das reações cruentas, não convocavam as derradeiras energias num arranque selvagem [...]”
“Os fantasmas estropiados como que iam dançando, de tão trôpegos e trêmulos, num passo arrastado de quem leva as pernas, em vez de ser levado por elas [...]”
“A seca representava a valorização da safra. Os senhores de engenho, de uma avidez vã […]”.
“Os vaqueiros másculos, como titãs alquebrados, em petição de miséria. Pequenos fazendeiros, no arremesso-se igualitário, baralhavam nesse anônimo aniquilamento [...]”.
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Questão 03 No trecho [...] “Eu não vou na sua casa,/ Você não venha na minha, porque tem a boca grande,/ Vem comer minha farinha [...]”, a função do “porque” utilizado é
indicar causa, motivo, justificativa ou explicação.
intensificar o sentido da expressão “boca grande”.
completar o sentido da expressão “boca grande”.
acrescentar ao período a ideia de uma conclusão.
dirigir-se de forma adversativa à oração anterior.
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Questão 04 No Texto 1, em “[...] O agente envolvido na causa da doença é o Vírus do Sarampo, que pertence ao gênero Morbillivirus, da família Paramyxovirida.”, a oração em destaque tem a função de
completar o sentido da expressão “causa da doença”.
relacionar-se à expressão “o agente envolvido”.
dirigir-se de forma restritiva à oração anterior.
acrescentar ao período a ideia de desfecho.
introduzir uma explicação sobre o vírus.
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Leia o texto e responda à questão 5. Eu também já fui brasileiro Carlos Drummond de Andrade Eu também já fui brasileiro moreno como vocês. Ponteei viola, guiei forde e aprendi na mesa dos bares que o nacionalismo é uma virtude. Mas há uma hora em que os bares se fecham e todas as virtudes se negam. Eu também já fui poeta. Bastava olhar para mulher, pensava logo nas estrelas e outros substantivos celestes. Mas eram tantas, o céu tamanho, minha poesia perturbou-se. Eu também já tive meu ritmo. Fazia isto, dizia aquilo. E meus amigos me queriam, meus inimigos me odiavam. Eu irônico deslizava satisfeito de ter meu ritmo. Mas acabei confundindo tudo. Hoje não deslizo mais não, não sou irônico mais não, não tenho ritmo mais não.
apontam a negação de valores a respeito da arte moderna no Brasil.
manifestam em sua intencionalidade quebra com ideias nacionalistas.
confirmam a preocupação parnasiana com versos octossílabos
abordam laços com a brasilidade em “moreno como vocês”.
expressam ideais do realismo em oposição ao modernismo.